Entre verbetes e canções
gênero e raça na definição de morocha
DOI:
https://doi.org/10.26512/cerrados.v34i67.56935Palavras-chave:
Coxilha Nativista, Dicionários, Estudos de gênero, Estudos de raça, História das Ideias LinguísticasResumo
No presente artigo, proponho uma análise histórico-linguística do verbete morocha, recortado do Dicionário de Regionalismos do Rio Grande do Sul (1996). Fundamentado nos pressupostos teórico-metodológicos da História das Ideias Linguísticas (HIL), considero que os dicionários, por meio de verbetes e suas definições, apresentam concepções acerca de certos sujeitos e dos lugares que a sociedade lhes reserva. Para realizar o gesto analítico, recorro ao conceito de reescrituração proposto por Guimarães (2005). Desse modo, é possível observar as relações semânticas que as palavras formam entre si, muitas vezes, engendrando um léxico depreciativo em relação a sujeitos socialmente marginalizados. O verbete morocha é definido no dicionário como: "Moça morena, mestiça, mulata, rapariga da campanha". Entre essas definições, destaco a palavra mulata, que carrega questões raciais relacionadas à escravidão e à estigmatização das mulheres negras no Brasil. Analiso, também, o funcionamento da palavra morocha na letra da canção homônima interpretada por Davi Menezes Junior e os Incompreendidos, no ano de 1984, durante o festival Coxilha Nativista, na cidade de Cruz Alta. Nessa análise, discuto a maneira como a linguagem pode atuar como uma ferramenta capaz de estigmatizar sujeitos, bem como trazer à baila questões de gênero e de raça nos dicionários e na Música.
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