O contrato racial como constituição não escrita do Brasil: ignorância branca e interpretação do direito à luz da filosofia política de Charles Mills

Autores

DOI:

https://doi.org/10.26512/revistainsurgncia.v10i1.51538

Palavras-chave:

Contrato Racial, Constitucionalismo, Contratualismo, Racismo, Charles Mills

Resumo

O artigo, essencialmente bibliográfico, se baseia no pensamento do filósofo afrojamaicano Charles Mills para defender a tese de que o contrato racial, tal como concebido pelo autor, é a verdadeira constituição do Brasil, não escrita e subjacente à Constituição Federal propriamente dita, na medida em que estabelece os filtros epistêmicos de interpretação do ordenamento jurídico como um todo. Para tanto, o trabalho reconstrói a crítica de Mills ao contratualismo clássico, bem como os conceitos de epistemologia invertida e ignorância branca. Argumenta-se, então, a partir de exemplos extraídos do direito brasileiro, que tal referencial ajuda a explicar por que um sistema jurídico aparentemente comprometido com direitos fundamentais convive com a violação sistemática de seus próprios preceitos.

Biografia do Autor

Sandra Suely Moreira Lurine Guimarães, Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, Brasil

Professora Adjunta da Faculdade de Direito da Universidade Federal Pará, Vice-Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Direito da mesma instituição. Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Pará. É membro da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/a. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Novas Formas de Trabalho, Velhas Práticas Escravagistas do CNPq. Pesquisadora da Clínica de Combate ao Trabalho Escravo da Universidade Federal do Pará. Possui experiência em Direito e Ciências Sociais e atua principalmente nos seguintes temas: violências de gênero, direito e gênero, discriminação racial, trabalho escravo.

Heitor Moreira Lurine Guimarães, Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, Brasil

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Pará. Vencedor do prêmio Horácio Schneider - Destaque de Iniciação Científica da UFPA em 2021 na área de Ciências Humanas. Tem interesse por Filosofia do Direito, Filosofia Política, Teoria Crítica e Teoria Racial Crítica. Experiência com traduções de textos de Teoria Racial Crítica de inglês para português. Experiência com organização de eventos. Atua como Educador Popular na Rede Emancipa de Cursinhos Populares, na condição de professor voluntário de Filosofia, unidade Belém (trabalho voluntário).

Referências

ALMEIDA, Matheus de Araújo. Maternidade contra o genocídio: o Movimento das Mães de Maio contra a democracia das chacinas. Antropolítica – Revista Contemporânea de Antropologia, v. 54, n. 3, 2022.

AMADOR DE DEUS, Zélia. Ananse tecendo teias na diáspora: uma narrativa de resistência e luta das herdeiras e herdeiros de Ananse. Belém: Secult/PA, 2019.

ANDRADE, Érico. Negritude sem identidade: sobre as narrativas singulares das pessoas negras. São Paulo: N-1 Edições, 2023.

BATISTA, Vera Malaguti. Difíceis ganhos fáceis: drogas e juventude pobre no Rio de Janeiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003.

BERTÚLIO, Dora Lúcia de Lima. Direito e relações raciais: uma introdução crítica ao racismo. Florianópolis: Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, 1983.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 03 set. 2023.

BRASIL. Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em: 29 out. 2023.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em: 30 out. 2023.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (8ª Região). Recurso Ordinário nº 0001300-37.2016.5.08.0115. 1ª Turma. Recorrente: Antônio Iago Silva dos Santos. Recorrido: Kasom Palmas Serviços Ltda, Belém Bioenergia Brasil S/A. Relator: Desembargador Francisco Sérgio Silva Rocha. Belém, 14 de março de 2018. Publicação Diário da Justiça Eletrônico, 19 de março de 2018.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (8ª Região). Recurso Ordinário nº 0000044-74.2021.5.08.0118. 4ª Turma. Recorrente: Sérgio Seronni, Sérgio Luiz Xavier Seronni, Ministério Público do Trabalho. Recorrido: os mesmos. Relator: Desembargador Walter Paro. Belém, 14 de junho de 2022. Publicação Diário da Justiça Eletrônico, 17 de junho de 2022.

CARNEIRO, Sueli. Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.

COLLINS, Patricia Hill. Aprendendo com a outsider within. Revista Estado e Sociedade, v. 31, n. 1, 2016, p. 99-127.

DUARTE, Evandro Charles Piza; QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. A revolução haitiana e o atlântico negro: o constitucionalismo em face do lado oculto da modernidade. Revista Direito, Estado e Sociedade, Rio de Janeiro, n. 49, p. 10-42, 2016.

KYMLICKA, Will. Contemporary political philosophy: an introduction. 2. ed. Oxford: Oxford University Press, 2001.

GOMES, Rodrigo Portela. Constitucionalismo e quilombos: famílias negras no enfrentamento ao racismo de Estado. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2020.

GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afrolationamericano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.

GUIMARÃES, Sandra Suely Moreira Lurine; BOUTH, Camila Lourinho. A exploração laboral como condição histórica na Amazônia. In: Anais do Congresso sobre Trabalho Escravo Contemporâneo da Amazônia: retrato do passado, análise do presente e perspectiva do futuro. Manaus: Escola de Direito da UEA, 2023. Disponível em: https://www.even3.com.br/anais/ictecam2023/628369-a-exploracao-laboral-como-condicao-historica-na-amazonia-e-os-reflexos-contemporaneos/. Acesso em 24 out. 2023.

HARAWAY, Donna. Situated knwoledge: the science question in feminism and the privilege of partial perspective. Feminist Studies, v. 14, n. 3, p. 575-599, 1988.

HARDING, Sandra. Rethinking standpoint epistemology: “what is strong objectivity” In: ALCOFF, Linda; POTTER, Elizabeth (Orgs.). Feminist epistemologies. Nova Iorque: Routledge, 1993.

HOBBES, Thomas. O Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

HUTCHINSON, Darren Lenard. Critical race histories: in and out. American university law review, v. 53, p. 1187-1215, 2004.

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA (IPEA). Perfil do processado e produção de provas nas ações criminais por tráfico de drogas: relatório analítico nacional dos tribunais estaduais de justiça comum. Brasília: IPEA, 2023. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/12376/1/RI_Perfil_producao_provas.pdf. Acesso em 20 out. 2023.

LOPES, Juliana Araújo. Constitucionalismo brasileiro em pretuguês: trabalhadoras domésticas e luta por direitos. Brasília: Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade de Brasília, 2020.

LOUREIRO, Violeta Refkalefsky. Amazônia: estado, homem e natureza. 4. ed. Belém: Cultural Brasil, 2019.

MARINI, Ruy Mauro. Dialética da dependência e outros escritos. São Paulo: Expressão Popular, 2022.

MILLS, Charles W. Ignorância branca. Griot: Revista de Filosofia, Amargosa, Bahia, v. 17, n. 1, p. 413-438, 2018.

MILLS, Charles W. O contrato racial. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.

PATEMAN, Carole. The sexual contract. Stanford: Stanford University Press, 1988.

QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. Constitucionalismo brasileiro e o atlântico negro: a experiência constitucional de 1823 diante da revolução haitiana. Brasília: Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade de Brasília, 2017.

QUEIROZ, Marcos Vinícius Lustosa. Constitucionalismo negro: elementos de teoria e história constitucional a partir da Revolução Haitiana. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito, Porto Alegre, v. 13, n. 1, p. 85-109, 2021.

RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Edição Original. Massachussets: Harvard University Press, 2005.

ROUSSEAU, Jean Jacques. Discurso sobre a origem e o fundamento da desigualdade entre os homens. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018.

SERRA NETO, Prudêncio Hilário. Contrato de parceria e escravidão por dívidas: desafios à integração da agricultura familiar no dendê. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016.

SCHUCMAN, Lia Vainer. Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo. 2. ed. São Paulo: Veneta, 2020.

SILVA JUNIOR, Alexandre Julião da. Abrem-se as cortinas do Teatro de Guerra: a “Chacina de Belém” e o assassinato de homens negros em cena. Belém: Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade Federal do Pará, 2023.

SIQUEIRA, Samara Tirza Dias. Mulheres negras no palco do debate sobre crimes raciais: uma análise das ofensas racistas no Tribunal de Justiça do Pará. Belém: Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade Federal do Pará, 2022.

SOARES, Marcela. Escravidão e dependência: opressões e superexploração da força de trabalho brasileira. Marília: Lutas Anticapital, 2022.

Downloads

Publicado

31.01.2024

Como Citar

GUIMARÃES, Sandra Suely Moreira Lurine; GUIMARÃES, Heitor Moreira Lurine. O contrato racial como constituição não escrita do Brasil: ignorância branca e interpretação do direito à luz da filosofia política de Charles Mills. InSURgência: revista de direitos e movimentos sociais, Brasília, v. 10, n. 1, p. 255–282, 2024. DOI: 10.26512/revistainsurgncia.v10i1.51538. Disponível em: https://www.periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/51538. Acesso em: 3 maio. 2024.

Artigos Semelhantes

1 2 3 4 5 > >> 

Você também pode iniciar uma pesquisa avançada por similaridade para este artigo.